sábado, 8 de maio de 2010

Era a mãe de um deles

A história recente no Brasil, que vem sendo mais amplamente conhecida, analisada, retratada nas últimas décadas após o fim do regime de ditadura militar (de 1964 a 1985), tem revelado inúmeros exemplos de coragem, dedicação, desprendimento de militantes políticos que lutaram, deram o melhor de si - e muitos a própria vida - para transformar a realidade de opressão e exploração capitalista em que vive o povo brasileiro.

Zuzu Angel não foi uma dessas militantes, era a mãe de um deles – Stuart Angel Jones. Ele iniciou sua participação política no movimento estudantil, quando era aluno da Faculdade de Economia da UFRJ, e passou a atuar no MR-8 (Movimento Revolucionário 8 de Outubro) e na resistência armada à ditadura militar. Era casado com a militante Sonia Moraes (também assassinada posteriormente). Aos 26 anos, Stuart foi seqüestrado, torturado barbaramente e assassinado pelos órgãos de repressão em 1971. Stuart não forneceu informações a seus algozes. Na tortura final, na Base aérea do Galeão, foi arrastado por um jipe, amarrado ao cano de descarga do veículo, obrigado a “cheirar fumaça de óleo diesel”, como denunciou Chico Buarque em sua canção “Cálice”, intoxicado até agonizar.

“Queria cantar por meu menino
Que ele já não pode mais cantar”

Zuzu, à época estilista de renome internacional, soube das torturas e do assassinato do filho por uma carta e desde então, corajosamente, fez de tudo para denunciar as torturas, a morte e a ocultação do cadáver de seu filho, no Brasil e no exterior. Como Stuart tinha cidadania norte-americana levou a denúncia à imprensa no exterior e entregou uma carta a Henry Kissinger, na época Secretário de Estado de Governo dos EUA, quando este estava em visita ao Brasil.

Incansável nessa luta, Zuzu fez também um desfile-denúncia, que ela classificaria como a primeira coleção de moda política brasileira - em que utilizava imagens de anjos amordaçados (alusão a Angel), meninos aprisionados, jipes. O desfile foi levado aos EUA, onde tinha entre suas clientes, artistas como Liza Minelli, Kim Novak, Joan Crawford.

Num momento de ampla censura, opressão e limitação das liberdades democráticas, sua atuação corajosa que denunciava a existência de tortura e de desaparecidos políticos no país ameaçava o regime. Passou a sofrer intimidações, ameaças, perseguições. Deixou cartas, mensagens, inclusive a Chico Buarque, a quem conhecia, afirmando que se acaso aparecesse morta “por acidente”, na verdade teria sido assassinada.

“Se eu aparecer morta, por acidente ou outro meio, terá sido obra dos assassinos do meu amado filho”

E foi o que ocorreu na madrugada de 14 de abril de 1976, quando seu carro foi abalroado na saída do Túnel Dois Irmãos (Rio de Janeiro), que hoje leva o seu nome. Para ela, Chico Buarque compôs a canção “Angélica” (abaixo).

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