Morrer é apenas não ser visto
(Fernando Pessoa)
por Fernando Carneiro
Onde estão nossos miseráveis? Segundo dados oficiais o Pará tem hoje cerca de 2,1 milhões de seres humanos vivendo abaixo da linha de miséria. Quase um a cada três paraenses. Você sabe onde eles estão? Muitos haverão de ser invisíveis aos olhos de quem está acostumado a viver em um mundo de exclusões. Muitos não são vistos e por essa razão estão quase mortos.
Mas mortos de verdade estão os 512 mil brasileiros assassinados no período de 1997 a 2007. Isso mesmo, mais de meio milhão de pessoas assassinadas em 10 anos. A maioria jovens meninos entre 15 a 24 anos. Boa parte negros, pois em 2002 morriam, vítimas de homicídio, 46% mais negros do que brancos. Já em 2007, apenas cinco anos depois, essa proporção se elevou para 108%.
No Pará, no mesmo período de 1997 a 2007, a taxa de homicídios aumentou 195%, o que fez com que pulássemos da 20ª para a 7ª colocação entre o ranking dos estados mais violentos. Entre as 15 cidades mais violentas temos duas: Marabá e Tailândia, sendo que esta ocupa o nada desejado posto de 3ª cidade mais violenta do país.
Miséria e violência andam juntas. Não precisa ser um cientista político ou sociólogo pra saber disso, mas estes números além de serem menosprezados ou escondidos pela propaganda oficial são ofuscados, entre outras coisas, pelo gasto de dinheiro público para fazer propaganda de uma empreitada privada: a construção de uma siderúrgica em Marabá pela Vale. Uma empresa que em muitos aspectos se configura como um estado dentro do estado.
Ao governo estadual, a quem cabe a obrigação de ver toda a população, os mortos e miseráveis são invisíveis. Neste caso, contrariando Saint Exupéry em seu antológico “O pequeno príncipe”, o essencial não é invisível aos olhos. E só vê bem com o coração, quem ainda se indigna diante de tanta iniqüidade.
Mudar esse mundo é preciso. Não dá mais para conviver com hipocrisias e mentiras oficiais, não dá mais para ouvir autoridades afirmarem que a culpa das mortes no desabamento do “morro do bumba”, em Niterói, é da população pobre que “resolveu morar” lá, como se tivessem opção de morar numa suíte na Viera Souto. Por isso revoltar-se é inadiável. Precisamos ver, precisamos não morrer, precisamos da luta.
Abril 2010
Fernando Carneiro é Historiador, membro da equipe editorial do Ponto de Pauta e pré candidato do PSOL ao Governo do Pará
Um comentário:
Tenho um poema, que escrevi há muito tempo, que demonstra os meus sentimentos sobre o grandes abandonados por nos:
Semelhança
Temos a mesma idade
Vamos na mesma cidade
Eu correndo
Ele indo lento
Eu comendo
Ele faminto
Acuado
Fedorento
Vagamente se perdendo
Vamos na mesma cidade
Mas ele esta velho
Ele esta só
Ele esta louco
O mendigo de 26 anos.
Júnia do Vale
Eles precisam mais de vc do que nós.
Um grande abraço!
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